Quando se pensa no parto, é comum criar imagens na mente em que tudo acontece como planeado, a dor é suportável, o ambiente é calmo e, no final, surge um momento digno de filme, cheio de alegria e um sentimento profundo de amor pelo bebé. Mas a realidade não tem guiões: o parto segue o seu rumo natural, baseado em uma única certeza, é incontrolável e os sentimentos também.
O parto é um processo natural, intenso e profundamente humano. Como tal, é imprevisível. Aceitar essa imprevisibilidade é, muitas vezes, o primeiro passo para vivê-lo com mais serenidade. Criar expetativas demasiado rígidas pode transformar-se numa fonte de frustração e até de culpa. Por isso, é essencial compreender que o parto não precisa de ser perfeito para ser valioso e transformador.
O mito do parto perfeito
Não existe “parto perfeito”. Cada mulher é única, cada bebé tem o seu ritmo e cada contexto traz variáveis próprias. O parto perfeito é aquele que se sonha viver e desejá-lo é perfeitamente normal. A mulher e o casal terem a noção de como gostariam de viver o parto é saudável e permite que se preparem para isso com mais consciência, mas é fundamental deixar espaço para situações inesperadas, que podem levar a uma realidade diferente da imaginada.
Estar consciente da imprevisibilidade do parto permite que a mulher e o casal estejam mais preparados para se adaptar a mudanças no processo. Quanto mais flexível for a postura perante o desconhecido, mais tranquila será a experiência.
O controlo é limitado
Um plano de parto é uma ferramenta importante, ajuda a clarificar os desejos do casal e a orientar a equipa de saúde. No entanto, não é um contrato. O corpo e o bebé nem sempre seguem o que foi idealizado. Ter consciência disso ajuda a reduzir frustrações e permite viver o processo com mais flexibilidade e tranquilidade.
É fundamental entender que, mesmo que haja mudanças ou intervenções inesperadas, isso não invalida a experiência nem diminui a sua importância. O essencial é que a mulher se sinta informada, respeitada e segura ao longo de todo o processo.
Não é só felicidade e serenidade
O parto é profundamente transformador, mas não é vivido apenas com uma única emoção. A intensidade do momento traz dúvidas, cansaço, sentimentos de impotência e até medo. Esses sentimentos são naturais e refletem a exigência física e emocional do parto.
Reconhecer esta dualidade ajuda a normalizar emoções que muitas mulheres, silenciosamente, consideram uma “falha” pessoal. Sentir medo ou insegurança não diminui a força ou a coragem que o momento exige.
A realidade nos dias de hoje
Se antes o parto já era imprevisível, hoje parece sê-lo ainda mais. Muitas mulheres relatam sentir-se ansiosas mesmo antes de engravidar, justamente pela incerteza sobre como será o processo. Desde a entrada na maternidade, à perceção de excesso de medicalização, intervenções pouco explicadas e ambientes hospitalares pouco acolhedores. Vários fatores contribuem podem contribuir para aumentar a ansiedade.
É importante sublinhar que essa ansiedade nasce muitas vezes da falta de informação ou da sensação de não ter voz no processo. Conhecimento, preparação e apoio adequado são fundamentais para viver a gravidez com mais segurança e confiança, e ajudam a transformar a imprevisibilidade em algo mais leve de enfrentar.
Susana Magalhães Patrício, enfermeira especialista em saúde mental, com especialização em saúde mental materna e vínculo precoce
Nota importante: Este conteúdo é de carácter meramente informativo e baseia-se em experiência profissional, bem como em conhecimento científico. Não tem a intenção de substituir uma avaliação individualizada por parte de um profissional de saúde.