Rossana Miranda acusou a Clínica Dr. Fernando Póvoas de lhe queimar o rosto após um procedimento estético. A jornalista angolana e pivô do Jornal da Tarde, da Televisão Pública de Angola, divulgou um vídeo nas redes sociais a contar a sua versão. A clínica já reagiu.
O incidente aconteceu na Clínica de Luanda (Fernando Póvoas, Médico de Clínica Geral e Medicina Estética, também tem outras duas clínicas em Lisboa e no Porto). “Estou a fazer este vídeo para explicar o que realmente se passou. O que me faz fazer este vídeo é reclamar não só os meus direitos enquanto cidadã, mas essencialmente enquanto cidadã angolana e enquanto consumidora”, começou por dizer.
“No dia 14 de dezembro fui à Clínica Dr. Fernando Póvoas, em Luanda, no Bairro Alvalade, fazer um microagulhamento, que é para tirar manchas e amenizar rugas de expressão. É um procedimento que eu já fiz em outras clínicas há alguns anos”, contou. No entanto, Rossana disse que foi realizado um “peeling com ácido, algo que nunca tinha feito” e não um microagulhamento, como a jornalista garantiu que tinha pedido. “O ácido acabou por queimar a minha pele”, afirmou, mostrado as zonas afetadas.
Preocupada, a jornalista terá ligado no dia seguinte à profissional que fez o procedimento, “que é uma cidadã angolana também”, e esta ter-lhe-á dito que “era normal”. “Eu expliquei que me estava a arder muito e que tinha colocado gelo, mas que não tinha sido durante muito tempo nem diretamente e ela disse que não fazia mal e que a minha pele dentro de 20 dias ia melhorar”, recordou. Tal não aconteceu. “A pele foi piorando, dia após dia, e ela só alguns dias depois conseguiu assumir que não era um microagulhamento, que era um peeling.”
Rossana decidiu então confrontar a profissional e esta disse-lhe que ela tinha marcado um peeling. “Não é verdade. E ainda se fosse verdade, acho que uma clínica ao notar que um procedimento correu mal tem que ter outro tipo de postura e não estar à procura de refúgios, de argumentos, de situações”, sublinhou.
Após ter sido feita uma tentativa de agendamento de consulta, uma vez que a jornalista não tinha disponibilidade naquele horário e a profissional não a conseguia encaixar na agenda depois, Rossana foi aconselhada a falar com os gerentes, que estavam em Portugal a passar o Natal. A época festiva passou e Rossana voltou a ligar e a dizer que queria falar com os gerentes. “Ligaram-me mais tarde a dizer que a gerente me podia receber no dia seguinte, ou seja, no dia 28 de dezembro, às 10 horas”, contou. O mesmo problema aconteceu: não havia compatibilidade de horário.
Ligou para a Clínica do Porto, sem sucesso. Na de Lisboa disseram-lhe que o rosto estava “mesmo queimado e a pele muito sensível, vai ter que colocar alguns cremes”. Deram-lhe umas amostras e disseram para regressar no dia 3 de janeiro. A jornalista assim o fez e a profissional disse-lhe que o rosto “continuava muito sensível, que não conseguia fazer um novo peeling” e que tinha que regressar novamente numa outra altura.
Indignada com o que estava a acontecer, Rossana contou que pediu, “de forma muito educada”, para falar com a gerente. Ao telefone, exigiu “uma gama completa de produtos porque era o mínimo que podia fazer para reverter a situação”. Os 20 dias já teriam passado e as manchas na cara não despareceram.
Rossana Miranda decidiu então, no dia seguinte, 4 de janeiro, pedir a opinião a uma outra clínica. “É o meu rosto, sou mulher, sou jornalista, trabalho com a televisão e, mais que isso, sou um ser humano”, destacou. “Nessa clínica disseram que havia solução, que é um processo que pode levar até 3 meses para reverterem, mas que requer algum investimento”, relembrou, acrescentando que pediu um orçamento para levar à Clínica Dr. Fernando Póvoas, em Luanda.
Polícia foi chamada ao local
No mesmo dia, à noite, a jornalista encontrou o senhor da receção da Clínica de Luanda e pediu-lhe que assinasse a cópia do orçamento. “Ligou para os gerentes. Sem ser xenófoba, mas vale aqui frisar que é um casal de portugueses”, explicou. Os gerentes chegaram à clínica e foi então que a confusão se instalou. “O gerente, de forma muito altiva, começou a dizer, ‘o que é que se está aqui a passar? Não vai receber nada [indeminização]. Chame aí a polícia'”.
A polícia foi chamada ao local pelos gerentes e a jornalista ligou ao marido, que também lá foi ter. Foi inclusive divulgado nas redes sociais um vídeo da discussão. “O processo que eu vou pôr contra a clínica, também vou ainda incluir este argumento que fui filmada sem a minha permissão”, defendeu.
“Naquele dia, por ter sido feito um telefonema por um amigo, apareceram seis efetivos da polícia, sendo três deles do SIC [Serviço de Investigação Criminal Angola], eu até lhes disse que não os temia, que aquilo era abuso de autoridade porque estavam de conluio com a clínica ou com a profissional da clínica. Eu sabia quais eram os meus direitos enquanto cidadã angolana, então eu não temia, porque a polícia quando tem que resolver assuntos, a polícia não resolve. Infelizmente, no nosso país a polícia gosta de intimidar o cidadão”, afirmou, referindo ainda que foi “extremamente lesada” e que “até hoje, a Clínica Dr. Fernando Póvoas não me pediu desculpa”.
Por fim, Rossana deixou três fortes declarações. “Se tivesse acontecido isto em Portugal, deste género, com uma cidadã portuguesa, já teríamos notícia em todo o lado”, “Nós pagamos impostos para a polícia estar aí e agir e a polícia manda 6 efetivos, inclusive o próprio chefe da polícia chega lá com um ar como se tivesse a intimidar. A polícia só não fez mais porque viu que era uma pessoa conhecida e porque viu que eu não me verguei mesmo na presença deles” e “um cidadão angolano que tivesse uma clínica em Portugal e que tivesse cometido um erro desta forma não estaria impune. Uma apresentadora ou jornalista portuguesa que lhe tivesse acontecido isto numa clínica em Portugal, a clínica estaria quase a ajoelhar-se a pedir desculpa”.
“Ponham-se no meu lugar, eu sou uma mulher, onde está a minha auto-estima? Não é algo que eu esteja a fazer só porque hoje acordei ‘vou lá, vou discutir, vou chamar nomes às pessoas’. Isto também é para alertar as autoridades sanitárias deste país, para alertar o Ministério do Interior para ver como as coisas funcionam aqui em Angola e para alertar também as associações e instuições de defesa do consumidor. Clínica Dr. Fernando Póvoas tenham vergonha”, rematou.
Clínica diz que jornalista não cumpriu as instruções pós-procedimento e rejeita racismo/ xenófobia
A Clínica Dr. Fernando Póvoas também se pronunciou sobre o assunto e emitiu um comunicado nas redes sociais a contar a sua versão. “Após as polémicas que circularam nas redes sociais relativas a um procedimento estético realizado na nossa Clínica de Luanda, sentimos necessidade de fazer o seguinte esclarecimento”, lê-se.
“No dia 14 de Dezembro, uma utente submeteu-se a um procedimento estético, por si agendado (um peeling de rosto) e, no final do mesmo, foram-lhe dadas todas as instruções necessárias ao bom funcionamento do mesmo: uso obrigatório de protetor solar 50+ e proibição de exposição solar”, lê-se. Estas medidas não foram adotadas pela utente, tendo ido de seguida fazer praia para Sangano e, após as consequências da exposição solar (avisadas pela profissional da Clínica), ainda colocou gelo na queimadura por sua própria iniciativa, agravando ainda mais”, continua.
“O procedimento efetuado – peeling com ácido mandélico – está indicado para peles sensíveis e é o melhor tolerado por peles negras, daí ter sido esse o escolhido para tratar a utente. Apesar de a Clínica Dr. Fernando Póvoas e os seus funcionários não se poderem responsabilizar pelos eventuais incumprimentos das regras dos tratamentos, ainda assim foi oferecida a possibilidade de ajuda para resolver o problema. Mais importa referir que a Clínica e todos os seus funcionários rejeitam qualquer tipo de crítica de comportamento racista e/ou xenófobos, comportamentos esses que repudiamos na sua totalidade. Lamentamos profundamente o que aconteceu a esta paciente porque entendemos a importância de qualquer tratamento, seja estético ou não, mas estamos conscientes de que para o sucesso dos mesmos, as regras específicas de cada um devem ser criteriosamente cumpridas. A Clínica Dr. Fernando Póvoas coloca-se à disposição para qualquer esclarecimento adicional”, remata.