Para entender a história de Charlotte Merryl Cohen-Tenoudji é preciso regressar aos anos 1980. Foi nessa altura que foi sequestrada, vendida e levada para França: foi vítima de tráfico de crianças. Na verdade, Charlotte é Isabella dos Santos, uma bebé sequestrada no Brasil e vendida no mercado de adoções ilegais.
Aos 25 anos, deixou para trás a sua história de filha de uma família de casse média francesa e saiu de Paris, apenas com uma mala na mão e sem saber falar português, de acordo com o Globo. Encontrou, em São Paulo, a família da mãe biológica, que foi assassinada três anos depois do seu nascimento. Mas a procura durou quase 20 anos.
Isabella foi vendida, quando tinha apenas dois meses, a um casal de franceses, que se revelaram desajustados e alcoólatras. Sofreu, inclusive, maus-tratos. Quando descobriu que era adotada e começou a questionar a sua origem, a mãe adotiva respondia que a tinha encontrado no lixo. Os abusos por parte dos pais adotivos fizeram com que estes perdessem a custódia e Isabelle foi para um abrigo, mas conseguiu prosseguir com os estudos. Hoje, aos 34 anos, é formada em Cinema e Letras pela Universidade de Sorbonne e fala quatro idiomas. “A minha vida é como se fosse a junção de várias novelas. Tentaram pulverizar a minha história, dividi-la em pedacinhos, e eu tive que catar cada peça”, disse, citada pela publicação.
Foi através de um teste de ADN, há quatro anos, que conseguiu comprovar que a sua mãe era Jaciara Lima dos Santos, uma empregada doméstica que trabalhou na casa do casal que a vendeu e a enviou para França. Jaciara foi assassinada em 1991, aos 25 anos, poucos dias depois de ter tido outro bebé, mas as circunstâncias nunca foram esclarecidas.
Isabella nunca mais esquecerá as palavras da irmã mais velha, Lucélia: “Ela disse que eu fui muito amada e que o grande desejo da minha mãe era reencontrar-me. Foi o melhor presente que recebi e a força decisiva para a minha reconstrução”, recordou.
Agora, Isabella pretende comprovar a identidade do pai biológico. O processo do caso está no tribunal e foi iniciado este ano, sendo que resta aguardar que os irmãos por parte do suposto pai, que foi cremado, aceitem fazer teste de ADN. “A minha última meta, depois de conseguir confirmar na Justiça o nome do meu pai, é ter uma nova certidão de nascimento”, contou, referindo que quer escrever uma autobiografia. “É uma forma de dar uma resposta às pessoas que fizeram isso comigo e esconderam o meu nome verdadeiro”, explicou.
Vendida por 15 mil euros
Como? Segundo o Globo, o modus operandi utilizado foi registar Isabella como gémea de outra criança. No entanto, chegou a ser atendida pelo próprio nome para exames num hospital de São Paulo, mas numa outra consulta já surgiu como Charlotte. Foram esses documentos de consultas médicas com nomes diferentes, encontrados por Isabella aos 15 anos, que resultaram nesta descoberta. Além de Lucélia, Isabella tem um irmão mais novo e outra irmã que também foi vendida a um casal estrangeiro, mas o seu paradeiro é desconhecido.
Cinco anos após a sua chegada a França, os pais adotivos conseguiram registá-la legalmente em França, o que sugere negligência das autoridades francesas. “Esperei 30 anos para comemorar aniversário no dia em que eu nasci”, afirmou. Isabella agora sabe ter nascido no dia 30 de abril de 1987.