O Supremo Tribunal dos EUA revogou esta sexta-feira o direito constitucional ao aborto, que existia no país desde 1973.
Esta decisão, tomada pela maioria dos juízes conservadores – com seis votos a favor e três contra -, não torna ilegais as interrupções da gravidez, mas deixa a regulamentação do aborto na tutela dos Estados, dos quais 13 têm leis destinadas a proibir a interrupção voluntária da gravidez de forma imediata, na sequência desta decisão.
Centenas de pessoas concentram-se num protesto em frente ao Supremo Tribunal, em Washington D.C., capital dos Estados Unidos.
O direito foi estabelecido no caso histórico de 1973, conhecido como ‘Roe v. Wade’, em que foi decidido que as mulheres grávidas têm o direito constitucional de interromper a gravidez até ao ponto de viabilidade fetal, ou seja, a partir do momento em que o feto pode sobreviver fora do útero, que ocorre geralmente em torno das 24 semanas de gestação, mas o entendimento varia de Estado para Estado.
Em maio, uma fuga de informação tornou público um rascunho que antecipava esta decisão do Supremo.
COMO SE CHEGOU A ESTE PONTO DE VIRAGEM NO SUPREMO DOS EUA?
Durante os seus quatro anos no Governo, o Presidente Donald Trump e os republicanos do Senado instalaram três juízes conservadores no Supremo, solidificando a maioria conservadora naquela que é a mais alta instância do poder judiciário norte-americano.
Os juízes Neil Korsch, Brett Kavanaugh e Amy Connie Barrett, nomeados por Trump, enfrentam acusações de terem enganado políticos e o público, uma vez que nas suas audiências de confirmação do Senado foram questionados sobre a questão do aborto e deram a entender ao público que não votariam para revogar a decisão Roe v. Wade.
Seis dos nove juízes atuais do Supremo foram nomeados por Presidentes republicanos. Os outros três foram escolhidos por chefes de Estado democratas.
PORQUE É QUE METADE DOS ESTADOS NORTE-AMERICANOS PODERÁ PROIBIR O ABORTO?
Ao anular a decisão Roe v. Wade, os Estados Unidos regressam à situação que existia antes de 1973, quando cada Estado era livre de proibir ou autorizar a realização de abortos.
Dada a grande divisão geográfica e política sobre a questão, espera-se que metade dos Estados, especialmente no sul e no centro, mais conservadores, proíbam rapidamente o procedimento, entre os quais Texas, Arizona, Missouri, Geórgia, Ohio, Indiana ou Wisconsin.
Antes da sentença, em 1973, 30 dos 50 Estados que compõem os Estados Unidos tinham leis que proibiam o aborto em qualquer momento da gravidez.
EM QUANTO TEMPO O ABORTO SE TORNARÁ ILEGAL?
O aborto torna-se automaticamente proibido em 14 Estados, seguindo-se outros 12, uma vez que vários estados colocaram já em vigor proibições severas, antecipando esta decisão do Supremo Tribunal.
Por exemplo, uma proibição do aborto promulgada em 1931 poderá voltar a vigorar no Michigan, onde a legislatura liderada pelos republicanos apoia a proibição, mas o governador democrata do estado contesta-a no tribunal estadual.
Em 2021, o Texas aprovou uma lei que restringe o aborto dentro de 30 dias a partir de qualquer decisão do Supremo.
Muitos Estados, especialmente aqueles governados por políticos conservadores, passaram a adotar a estratégia de aprovar leis cada vez mais restritivas, ao regular as circunstâncias em que o procedimento é permitido, mesmo sem contrariar frontalmente a decisão do Supremo.
Assim, apesar de legal, o aborto era muitas vezes inacessível na prática, dependendo das condições financeiras da mulher e das leis do estado onde mora.
“SUPREMO ATACOU LIBERDADE DE MILHÕES”
O antigo Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama reagiu entretanto à decisão do Supremo Tribunal. Numa publicação na rede social Twitter, acusa o Supremo de atacar as liberdades fundamentais de milhões de mulheres.
Today, the Supreme Court not only reversed nearly 50 years of precedent, it relegated the most intensely personal decision someone can make to the whims of politicians and ideologues—attacking the essential freedoms of millions of Americans.
— Barack Obama (@BarackObama) June 24, 2022