Jovens portuguesas perderam tudo em incêndio na Guatemala: “Só restava cinzas e as molas dos colchões”

Catarina e Mafalda contaram à SIC Mulher como tudo aconteceu.

Créditos: Catarina Dinis e Mafalda Vidigal
Créditos: Catarina Dinis e Mafalda Vidigal

SIC Mulher

Como tantos outros jovens, Catarina Dinis, de 22 anos, e Mafalda Vidigal, de 23, decidiram fazer um ‘gap year’ e partir à descoberta da América do Sul ou, pelo menos, esse seria o plano inicial. Mal sabiam elas que iriam perder tudo poucos dias antes de regressarem a Portugal. Um episódio que as deixou “em pânico”, como contam em entrevista exclusiva à SIC Mulher.

Catarina, natural de Portimão, tinha terminado a licenciatura e Mafalda, das Caldas da Rainha, estava a trabalhar quando tomaram a decisão. Na altura, ambas viviam em Inglaterra. No dia 31 de dezembro de 2022 colocaram as mochilas às costas e partiram à procura de aventuras para contar no podcastFor The Plotcast‘.

O primeiro país foi a Colômbia e depois o Equador. Entretanto, mudaram de ideias e optaram pela América Central e, por fim, América do Norte, onde se encontram neste momento. Já lá iremos. Por motivos pessoais, chegaram a Guatemala em dias diferentes, no dia 9 e 10 de maio, e estava previsto ficarem duas semanas.

Créditos: Mafalda Vidigal e Catarina Dinis

“As janelas estavam todas a explodir”

As jovens estavam alojadas no Mandalas Hostal, em San Pedro La Laguna, quando decidiram ir a uma festa num barco no dia 20 de maio. “A festa começou às 10 horas. Entretanto, eu fui deixar a Catarina a casa para ela descansar um bocado e fui para a after party, que já era em terra, por volta das 15 horas”, conta Mafalda.

“Era um quarto com quatro camas. Só estávamos nós as três [inclusive Sara, a sua prima]. Estava deitada a descansar, meio acordada, meio a dormir, e levantei-me em pânico, olhei lá para fora e só vi imenso fumo e chamas, relembra Catarina, que agarrou na mala pequena que tinha levado para a festa e saiu a correr do quarto.

Entre o tempo de me levantar e sair, uma das janelas explodiu e as chamas saltaram lá para dentro e apanharam uma das camas. A cama começou logo a arder, acrescenta. Foi então que a jovem ponderou: “‘Vou ou não vou buscar a mochila?'”. Decidiu não o fazer. As janelas estavam todas a explodir e a minha cama estava debaixo de uma. Estava com imenso medo que a janela explodisse e me magoasse”, diz.

Arderam dois quartos, o das jovens e outro que estava no andar superior. “As coisas delas nem sequer havia hipótese, estavam fechadas num cacifo de madeira. Foi azar, os quartos debaixo tinham cacifos de metal”, explica.

Créditos: Mafalda Vidigal e Catarina Dinis

Só me lembro de dizer ‘não sobra nada’ e desmanchei-me em lágrimas

O incêndio começou na casa ao lado e provocou sérios estragos. “Apareceram os vizinhos numa pickup truck [para apagar o fogo]”, recorda, referindo que não existem bombeiros em Guatemala. Quando o fogo foi controlado, os andares superiores já tinham ardido completamente, como é descrito no GoFundMe, criado para angariar dinheiro para que o hostel possa reabrir portas e as pessoas possam regressar ao trabalho. Ninguém ficou ferido.

Naquele momento, Mafalda ainda não estava no local. Quando a amiga a foi buscar, a jovem não estava preparada para o que ia encontrar: “Assim que entrei pela porta vi que não restava nada, só cinzas e as molas dos colchões, diz. “Só me lembro de virar para a Catarina, porque ela ainda não tinha entrado, e dizer ‘não sobra nada’ e desmanchei-me em lágrimas, acrescenta.

Ficaram literalmente apenas com a roupa que tinham no corpo. Catarina estava descalça e somente de biquíni, enquanto Mafalda estava calçada e, para além do biquíni, também tinha umas calças. O que foi possível salvar? Poucas coisas. “Encontrámos alguns patches da mochila, restos de coisas que ainda queríamos guardar para memórias, o diário de viagem da Catarina, uma AirTag e mais nada”, conta.

As jovens também conseguiram encontrar os passaportes, mas o de Mafalda “não estava legível”, assim como o de Sara. “A página mais importante é de plástico, colou, então não dá para abrir e ver que é o meu passaporte”, explica Mafalda.

Créditos: Mafalda Vidigal e Catarina Dinis

A resolução

Embora o seguro do hostel não cobrisse incêndios, uma vez que também não havia alarme de incêndio, o proprietário deu-lhes 300 euros no total para ajudar nas despesas que teriam. “Rapidamente percebemos que só precisávamos de roupa interior, duas trocas de roupa, carregador e pasta de dentes e foi isso que comprámos no dia a seguir e é praticamente isso que ainda temos”, diz.

As jovens ficaram duas noites em outro hostel em San Pedro La Laguna para resolver o que seria possível, relativamente a seguros e documentos da polícia, e seguiram para a Cidade de Guatemala. Como Portugal não tem embaixada no país, contactaram o Ministério dos Negócios Estrangeiros que lhes deu duas opções: ou aguardavam em Guatemala até lhes ser enviado um título de viagem único ou seguiam para o México para fazer o passaporte na embaixada de Portugal. Optaram pela segunda opção: “Não queríamos que o incêndio fosse a última memória depois de seis meses incríveis.”

Foram à embaixada de Espanha na Guatemala para pedir o Emergency Travel Document, que está disponível para todas as pessoas dos estados membros da União Europeia, e no mesmo dia viajaram para o México, onde foram tratar dos passaportes de emergência, que já estão na sua posse.

@mafaldavidigal

I must say, I don’t like this plot twist😢. Trying to keep the “everyone is fine” mindset and focus on that. #travellife #backpacking #fire #losteverything #travelproblems #accident #travelaccidents #losingeverything #whathappened

♬ I try not to km.. – ✂️

Apesar do valente susto, há algo que Mafalda ouviu da sua mãe quando lhe ligou a chorar e que não esquece: “‘Mafalda, não faz mal, as memórias tu ainda as tens’”. E mais: “Quando eu percebi o quão em perigo a Catarina esteve, para mim passaram mesmo a ser coisas”, afirma.

O vídeo onde as jovens mostram o que lhes aconteceu tornou-se viral no TikTok e uma das discussões foi se se deve ou não deixar o passaporte nos alojamentos. Para as jovens, a resposta é simples: “Nós sabemos perfeitamente que foi a melhor decisão e faríamos novamente. É um incêndio, não havia probabilidade nenhuma de prever isto”, concluem.

Catarina e Mafalda regressam a Portugal no dia 9 de junho e com uma experiência insólita para contar.