Grande Reportagem: Crianças de Chernobyl (23-04-2006)

Reportagem premiada, ex-aequo com uma reportagem do DN, com o Prémio da AMI - Jornalismo Contra a Indiferença 2006; Menção honrosa no Prémio Cáceres Monteiro 2006. Dur: 50'  

-reportagem

Passam vinte anos sobre o maior acidente nuclear da história da humanidade, mas a verdadeira história de Chernobyl ainda está por contar. É difusa a memória do acidente, é imprecisa a contabilidade das vítimas. Entre as querelas científicas à volta dos efeitos da explosão nuclear, sobra uma verdade insofismável - as crianças foram as grandes vítimas de Chernobyl.
Num raio da 30 km à volta do reactor 4, o coração da tragédia, não há crianças. Foram desalojadas 350 mil pessoas, só 400 idosos voltaram. Anastasia Tchikalovets, de 82 anos, foi um deles. Regressou ao único sítio onde foi feliz, a aldeia de Opachichi, a 20 km de Chernobyl. Uma aldeia com apenas 19 habitantes - já foram mais de 3 mil - que, no Inverno, rodeada de densas florestas e com a neve a tornar as estradas intansitáveis, fica isolada do Mundo durante semanas.
A vida de Anastasia faz-se de partidas e regressos. Já tinha sido desalojada em 1942 pelas tropas nazis, voltou a sê-lo em 1986 por causa do acidente nuclear, agora diz que só sai para junto do marido, que está no cemitério de Opachichi, enquanto enche a mesa com copos de vodka caseira, pimentos, fruta e cogumelos, o produto mais perigoso da região. Para ela, que come o que a terra dá, a radioactividade pura e simplesmente não existe, "se não já estaria morta há muito tempo". Anastasia gosta de jogar aos dados com a vida.
Do outro lado do Mundo, em Cuba, há um programa de ajuda às crianças vítimas de Chernobyl. No complexo hospitalar de Tarara já foram tratadas mais 18 mil crianças provenientes da Ucrânia e da Bielorrússia. Trata-se de uma zona rica em iodo, ideal para tratar problemas da tiróide, sobretudo o cancro da tiróide - a principal doença que é consequência directa da explosão nuclear. Mas o caso mais extraordinário que alguma vez passou por Tarara é o de Vladimir "Salaki". Chegou a Cuba com dez anos e o diagnóstico de uma doença incurável. Não conseguia sentar-se, deitar-se, não era sequer capaz de mastigar. A mãe tinha de levá-lo em braços para todo o lado, para a praia, para o quarto, escadas acima. Doze anos e cinco operações depois, duas neurológicas e três ortopédicas, Vladimir conseguiu sobreviver. Mais, já se senta, come, deita-se e consegue caminhar pelo seu pé. Reduziu a dose diária de medicamentos de 78 para apenas seis. Vladimir deu a entrevista à SIC num castelhano fluente.
Vladimir e Anastasia são o tipo de pessoas que enriquecem a experiência de qualquer repórter. Têm história, vidas de luta e sofrimento, e a inteligência no olhar. No Jornal da Noite de Domingo vamos conhecer estas duas e muitas outras histórias e personagens. Venha conhecê-las na grande reportagem SIC/Expresso "As crianças de Chernobyl"
Daniel Cruzeiro


Jornalista: Daniel Cruzeiro
Imagem: Renato Freitas
Edição de Imagem: Gonçalo Freitas
Grafismo: Paulo Alves; Rui Aranha
Produção: Isabel Mendonça